terça-feira, 21 de setembro de 2010

Vai e Vem

Dizem que George Orwell errou quase tudo no seu livro 1984. Acho que ele acertou quase tudo. A começar pelo conceito do Big Brother, que hoje se manifesta em nosso dia-a-dia de tantas formas: de programas de televisão a câmeras de vídeo que nos acompanham a todo instante, a controles de fronteiras, ao programa Echelon, dos EUA, que monitora toda a comunicação eletrônica no mundo. Ele acertou também na globalização e na formação dos blocos político-econômicos.Mas onde ele mais acertou, a meu ver, foi no conceito do dupli-pensar, na revisão da verdade a todo momento, e na formulação de uma nova verdade, ou mentira, não importa, a todo momento, basta que seja um instrumento útil para aquele momento. Até porque dali a pouco teremos outra verdade, outra mentira, outra palavra de ordem.A procura da nova fórmula do negócio da propaganda e o estado de surpresa dos líderes desse negócio refletem um pouco o jogo de vai-e-vem que domina o mundo. A globalização deu certo, mas também não deu, porque criou problemas com os quais não sabemos lidar.O que tira emprego dos americanos não é a concorrência das empresas dos outros blocos econômicos, mas as próprias corporações dos EUA que fazem outsorcing na Ásia. Ou qualquer outro lugar, não importa qual.Criar valor para os acionistas desculpou um descompromisso com a continuidade das empresas. O negócio é o aqui e agora. Depois, quem estiver no meu lugar, que resolva.Racionalizar portfolios justificou o maior movimento de assassinato de marcas que já se viu. Tudo muito bem planejado, analisado, justificado com planilhas eficientes. O compromisso dos funcionários das empresas com os resultados, que geravam bônus, uma idéia que parecia até meio socialista, provocou uma onda de manipulação de balanços, os escândalos corporativos - uma maneira delicada de falar em roubo -, de proporções inusitadas. Uma das maiores e mais antigas empresas de auditoria do mundo foi-se nessa. No mundo do marketing as empresas descobriram o star system e apareceram os homens que dominavam as novas fórmulas: ceos milagreiros, marqueteiros milagreiros, financeiros milagreiros, devidamente sacralizados pela imprensa, que no vai-e-vem nos apresentava um novo milagreiro a cada edição.E, no vai-e-vem, a qualificação "profissional agressivo" aplicou-se ao sujeito simplesmente antiético. E aí nos convencemos de que existe milagre, e saímos todos à procura de um milagre, vulneravelmente prontos para acreditar nele. A necessidade de uma fórmula salvadora, que simplificasse um mundo complicado, nos fez crédulos. E com isso bastava alguma coisa ser nova para ser boa. Agora é isso e não mais aquilo. Vai e vem.Então, acreditamos que a internet ia matar a comunicação de massa. Não aprendemos nada. Não lembramos que o rádio não matou a imprensa, o cinema não matou o rádio, o vídeo não matou o cinema, o MP3 não vai matar o CD. Nada mata nada. Tudo converge. Tivemos de ler livros que falavam no fim do marketing, no fim da propaganda. Está na hora de começar a falar no fim do fim.Nos últimos anos, o princípio do crescer e multiplicar foi substituído pelo cortar e racionalizar. Corto os produtos pela metade, as fábricas pela metade, os funcionários pela metade, pego o meu e pronto. É uma fórmula. Não deu certo. Já pensou em Deus falando: cortai e racionalizai?Os verdadeiros construtores do negócio da comunicação não procuravam fórmulas. Procuravam invenção. Invenção significa somar, crescer, adicionar, melhorar, aperfeiçoar. Temos a chance de inventar. Chega de vai e vem.
(Paulo Ghirotti)

Agência Criativ
Retirado do site: Portal da Propaganda / Zona Livre - 21/09/10 – 11:00hrs

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