terça-feira, 16 de novembro de 2010

O FIM DA PUBLICIDADE

Num país distante daqui, um sujeito estava vendo tevê. Passou um comercial de cerveja. O sujeito sorriu. Na verdade, gargalhou. Ele gostava de comerciais como aquele, com bom humor. Aí ele olhou para o lado e viu que seu filho tinha gostado também: “Legal esse né, pai?”. Concordou. E passou a odiar aquele comercial.
Como é que podia um comercial engraçado, agradar também ao seu filho, um imberbe menor de idade? Se eu, que sou inteligente para discernir entre o certo e o errado, quase gostei desse comercial como não estará a legião de pobres incautos consumidores?
Decidiu escrever uma carta para o Congresso. Algum deputado leu e concordou: inteligente, já havia pensado nisso. Fez um projeto de lei que foi votado e… pronto, salvou a sociedade: nunca mais haveriam comerciais de cerveja a infestar as ingênuas e influenciáveis cabecinhas.
Tempos depois, outro consumidor atento reparou nos comerciais de cosméticos. Ora, raciocinou, a busca pela juventude eterna, a celebração da estética em detrimento do conteúdo verdadeiro de nossas almas. Isso corrobora o abismo entre os despossuídos, que estarão irremediavelmente associados ao conceito do “feio” enquanto aos mais ricos e abastados caberá sempre a imagem de jovialidade, beleza e saúde. Solução: fim da propaganda de cosméticos em geral.
Todos aplaudiram no congresso daquele país. Mas, eis que outro senador, igualmente inteligente (mais que a média da população daquele país, com tão poucos consumidores inteligentes) levantou outra questão. Se automóveis atropelam e matam, então melhor seria que não fossem anunciados para não despertarem nas próximas gerações a vontade de dirigi-los.
Foi por aclamação. aprovado. Assim como a emenda contra propagandas de hambúrgueres, e, já que esse era o assunto, de alimentos e restaurantes em geral, que era mesmo um despautério num país com tanta fome se admitir propaganda mostrando pessoas felizes comendo.
Aliás porque era mesmo que as pessoas tinham que estar alegres na publicidade? Para despertar rancor nos entristecidos? E ficou proibido o sorriso na propaganda daquele país. No máximo seria permitida uma leve insinuação, de canto de boca. E depois da meia-noite, já que os tristes dormem cedo. Alguém lembrou dos insones solitários. E cortaram do texto aquela liberalidade.
Propaganda de moda? Segregacionista. De sabão em pó? Racista, sempre que valoriza o branco. De banco? Pelo amor de Deus, será que ninguém ainda parou para ver o que está embutido nas mensagens dos comerciais de banco, gente? A sensação de que só com o dinheiro se pode ser feliz, lógico! Cartão de crédito? Este mês até sem dinheiro você pode ser feliz, caramba.
Nos jornais, a imprensa apoiava cada uma das medidas. Alguns jornalistas adoravam a idéia de que seus salários são integralmente pagos pelo leitor que compra jornal na banca: publicidade só enfeia o conteúdo editorial.
A sociedade acuada pela sórdida propaganda apoiava as medidas. E reclamava de toda a publicidade que brincasse com qualquer uma das suas convicções pessoais. Gordo, não pode, magro também, . Padre, freira, careca, viúva, estudante, feio, bonito, mais ou menos feio, surfista , narigudo…nem pensar. Satirizou homem, é feminista. Mulher, lógico, é machista. A sociedade estava de mau-humor.
Até que um dia, alguém na casa do vizinho sorriu. Na verdade, gargalhou. E o sujeito que ouviu aquilo, não se sabe por que, teve a intuição de que aquilo tinha alguma coisa a ver com a *&*%#!+*# (a palavra “propaganda” tinha sido proibida). Será que haviam inventado o câmbio negro de *&*%#!+*# e o meu vizinho conseguira com traficantes uma fita de vídeo cheinha de *&*%#!+*#s engraçadas?, pensou o formador de opinião. Pelo sim pelo não, ele chamou a polícia.

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